Os Globos de Ouro premeiam os melhores da arte, entretenimento, humor e moda, mas um dos momentos altos da noite é sempre o desfile das estrelas pela passadeira vermelha. Este domingo não foi exceção e a cerimónia encheu o Coliseu dos Recreios de Lisboa de brilho, glamour e cor. Houve caudas exageradas, decotes pronunciados, mas poucas transparências.
Em Portugal não foi feita qualquer imposição às estrelas quanto aos looks escolhidos, ao contrário do que aconteceu na edição deste ano do Festival de Cannes, onde o novo código de vestuário que deu que falar. A nudez e as grandes caudas foram expressamente proibidas em nome da “decência” e a organização aconselhou as celebridades a optarem por looks mais sóbrios.
Se para uns estas imposições possam ser um limite à liberdade de expressão, dado que a moda e a maneira como cada um se apresenta são consideradas maneiras de comunicar, para outros pode ser entendida como uma maneira de impor algum recato e evitar polémicas, como a que rebentou quando a mulher de Kanye West, Bianca Sensori, desfilou com um vestido totalmente transparente nos Grammys.
Mas estaremos a voltar atrás e a ficar, novamente, mais conservadores? A estilista Fátima Lopes considera que as novas regras de vestuário de Cannes “não serão exemplo para mais nenhum outro evento internacional” e relembra que o festival de cinema “sempre foi muito conservador”. Ao 24Horas, a estilista garante que “os estilos e exuberâncias com grandes caudas, cada vez mais, fazem parte”, sendo “quase obrigatórios”. Por isso, a estilista não acredita que as regras venham para ficar, considerando-as “uma exceção”.
A estilista realça que o conservadorismo de Cannes “não é de agora” e recorda uma época em que o festival proibia que senhoras usassem saltos rasos: “Tenho a ideia de que há alguns anos eles proibiram o salto raso, por exemplo. E acho que proibições não fazem sentido. A mim não fazem sentido.” Esta proibição levou a atriz Kristen Stewart, em 2016, a tirar os sapatos e desfilar descalça na passadeira vermelha do Festival de Cannes como forma de protesto.
Para Fátima Lopes, o novo código de vestuário pode estar relacionado com a nudez de Bianca Sensori nos Grammys: “Talvez tenha um bocadinho a ver com isso, porque foi mau demais.”
Sobre as caudas exageradas, Fátima Lopes entende a proibição já que podem atrapalhar “a entrada das figuras e dos seus vestidos e depois a forma como se sentam”.

Limitação para os estilistas
Fátima Lopes assume que o novo código de vestuário representa uma limitação na liberdade criativa dos estilistas, mas acredita que as imposições do Festival de Cannes não deverão alastrar-se a outros eventos.
Apesar de se mostrar contra as restrições, Fátima Lopes garante que o dress code deve ser respeitado pelos convidados: “As pessoas aceitam o convite e têm que respeitar o dress code que é proposto. Agora, se faz sentido, ou não, acho que cada um sabe de si.”
Contudo, Fátima Lopes acredita que “iremos continuar a ver os vestidos exuberantes em todas as passadeiras vermelhas, como sempre”.
Regras “têm que existir”
Já o modelo e stylist Pedro Crispim acredita que as imposições e regras relativamente ao vestuário na passadeira vermelha “têm que existir”, caso contrário “tudo é possível, inclusive: não respeitar o dress code, não respeitar o convite, não respeitar a instituição, a empresa, a pessoa que convida”. Apesar de concordar com a imposição de alguns limites, o stylist defende que estes não devem castrar “a criatividade ou a identidade do artista”.
Para Pedro Crispim, a imagem e a maneira como cada um se apresenta nos eventos não é inocente: “Acho que as pessoas têm consciência, quando utilizam determinadas peças, determinados acessórios, determinada roupa, determinado look, quando utilizam o seu corpo como uma ferramenta para comunicar, para passar uma mensagem, elas têm consciência de que vão ser de alguma forma analisadas, criticadas, julgadas.”

O modelo realça que a escolha de looks exuberantes e controversos é uma decisão consciente das figuras públicas, que percebem que vão “dão que falar e que vão causar impacto”. Ainda assim, Pedro Crispim garante que esta é “uma fatura que elas estão dispostas para pagar”.
Sobre a questão da nudez em particular, Pedro Crispim considera que “existem locais para fazer as coisas” e dá como exemplo as próprias redes sociais: “No meu Instagram, eu costumo colocar fotos mais despido. Mas, acho que, no meu caso específico, se eu vou a um evento tenho que, acima de tudo, respeitar realmente a estrutura que me convida.”
O stylist assume que quando alguém aparece despido, como aconteceu com Biana Sensori, acaba por ser criar “névoa em cima do objetivo principal do evento em causa”. Na opinião de Pedro Crispim as regras de vestuário de um evento devem ser sempre acatadas, já que os convidados quando aceitam ir a uma festa estão “a aceitar também as regras”.
O modelo lembra a velha máxima de que “a nossa liberdade termina onde começa a do outro” e que há que respeitar os outros.